CRIATIVIDADE HUMANA E INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA: ENTRE AUTOMATOS E AUTORES – UMA BREVÍSSIMA ANÁLISE
DOI:
https://doi.org/10.24325/issn.2446-5763.v11i32p1-22Keywords:
Boden, Nöth, Criatividade, IA, ProduçãoAbstract
A criatividade tem sido tradicionalmente considerada um dos traços mais distintivos da cognição humana. Nas artes, nas ciências ou na vida cotidiana, ela é frequentemente associada à capacidade de produzir ideias, soluções ou artefatos que sejam simultaneamente novos, surpreendentes e valiosos (BODEN, 2004). No entanto, a emergência de sistemas de inteligência artificial generativa, como os Large Language Models (LLMs), impõe novos desafios conceituais a essa definição, ao simular processos de geração textual que, à primeira vista, evocam atributos criativos. Essa convergência entre cognição humana e geração automatizada demanda uma investigação mais cuidadosa sobre os fundamentos, limites e implicações do que se entende por criatividade — tanto no plano psicológico quanto no ontológico e epistemológico.
A presença crescente de sistemas generativos no campo da escrita, da arte e da ciência configura não apenas os processos de produção simbólica, mas também as categorias de autoria, agência e valor criativo. Autores como Margaret Boden (2004) propuseram tipologias amplamente aceitas sobre a criatividade — dividindo-a em combinatória, exploratória e transformacional —, que servem como base para avaliar até que ponto sistemas computacionais são capazes de realizar operações criativas em algum sentido não trivial. Por outro lado, críticas como as de Franceschelli e Musolesi (2025) e Moruzzi (2025) e a problematização de Nöth (2001) enfatizam a ausência de intencionalidade, consciência e contexto social nas máquinas, levantando dúvidas sobre a legitimidade de atribuir criatividade a agentes não humanos.
Diante desse panorama, exploramos uma brevíssima cartografia comparativa entre criatividade humana e criatividade artificial, com ênfase na análise de modelos generativos de linguagem. Parte-se da hipótese de que, embora os LLMs sejam capazes de produzir textos que aparentam criatividade, essa aparência não deve ser confundida com equivalência ontológica ou epistemológica. Ao contrário, a criatividade artificial exige ser analisada em seus próprios termos — técnicos, semióticos e filosóficos —, sob o risco de obscurecer as distinções fundamentais entre autômatos e autores que, vale ressaltar, ainda se encontra em um momento em que fronteiras (se é que as há) encontram-se borradas.
O trabalho se estrutura a partir da taxonomia de Boden (2004), das contribuições recentes de Franceschelli e Musolesi (2025) e Moruzzi (2025), dos fundamentos epistemológicos de Norbert Wiener (1950) e da teoria semiótica de Winfried Nöth (2001; 2025), com base no pensamento de Charles S. Peirce. A proposta é construir um pequeno arcabouço interpretativo que permita pensar a criatividade artificial não como simples mimese computacional da criatividade humana, mas como fenômeno técnico-simbólico com implicações próprias.
O artigo está organizado da seguinte forma: na seção 2, apresenta-se o panorama teórico da criatividade, com destaque para as classificações de Boden. A seção 3 discute a emergência da criatividade computacional, com foco nos LLMs. Na seção 4, são analisadas as dimensões filosófica e epistemológica da criatividade, com ênfase na crítica à equivalência entre produção e criação. A seção 5 introduz a questão da semiose e da informação a partir de Wiener e Nöth. A seção 6 propõe uma cartografia comparativa entre humano e máquina. A seção 7 discute as implicações éticas, culturais e epistemológicas dessa nova ecologia simbólica. Por fim, a seção 8 apresenta as considerações finais.
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